A
QUARESMA NA UMBANDA
Nossa religião é cristã. No entanto, devemos separar
com clareza o que faz parte dos ensinamentos de Cristo e o que é parte da
Igreja Católica. Devemos separar, portanto, os ensinamentos cristãos dos ritos
criados por outras religiões e Igrejas cristãs. Se nos perguntarem se Jesus é
filho de Deus, diremos que sim, é claro. Todos somos filhos de Deus. A grande
diferença entre a humanidade e Jesus é que ele evoluiu a um ponto que é
colocado como o Cristo. Cristo significa na sua origem em grego o ungido, que
seria aquele que foi escolhido para trazer as palavras de Deus. É o mesmo que
Messias.
Como sabemos, todo verdadeiro sábio é um mestre, no
sentido lato da palavra. Ele traz para o mundo e, em especial para sua
comunidade, ensinamentos que ajudarão na evolução espiritual de dos irmãos que
de alguma forma o seguem. Tivemos vários mestres no mundo e a própria Bíblia
nos fala deles. Eram os chamados profetas.
Porém, com Jesus foi diferente de todos esses mestres,
já que em sua última encarnação foi chamado de “o ungido”, ou seja, mais que um
sábio, um ser que traria os ensinamentos que perdurariam no tempo e serviriam
para nos conduzir no caminho da evolução, no caminho de Deus, independentemente
do nível em que nos encontramos.
As pessoas costumam perguntar o que teria aprendido
Jesus nesta encarnação. Uma passagem do Evangelho, o da mulher Cananéia - Mateus 15, 21-28
- que pede, aos gritos, que Jesus cure sua filha, mostra um Jesus arrogante nas
suas respostas à mulher, duro e inflexível, dizendo-lhe - "Não é bom tirar o pão dos filhos e
dá-los aos cachorrinhos". Os judeus tratavam os cananeus de cachorros. A
mulher lhe responde –“Também os cachorrinhos comem das migalhas que caem das
mesas dos seus donos". Diante
desta resposta, Jesus entende que tinha vindo no mundo para todos os povos e
não somente para os judeus. Com isso,
Jesus muda sua posição, lhe diz que a fé da mulher a havia salvado e ajuda à
filha dela. Neste momento Jesus se desgarrou de sua origem, e se tornou
universal. O que ele aprendeu aqui? Humildade, já que para ele até aí somente
havia um povo escolhido, o seu, o judeu. Em outra passagem ele manda seus
apóstolos pregarem, mas recomenda, não entrem nas terras dos pagãos. Sempre que
um espírito reencarna alguma coisa ele vai aprender. Não se volta à matéria sem
um motivo.
Assim, o homem Jesus reencarnou, para sua última vida
na matéria. Atingiu o ápice de seu crescimento espiritual e, por isso,
tornou-se um filho especial de Deus. A humanidade toda chegará a este ponto de
desenvolvimento espiritual, cada ser humano ao seu tempo.
Voltemos à quaresma. Esse período que hoje é de
quarenta dias, já foi de três, de trinta e por fim chegou a quarenta. Por que
chegou finalmente aos quarenta dias. O número quarenta tem uma presença muito
significativa na Bíblia. O dilúvio decorreu por quarenta dias e quarenta
noites; Moisés caminhou quarenta anos pelo deserto com o seu povo; Jesus se refugiou
no deserto por quarenta dias, e vários outros eventos ocorreram nesse período.
Por isso a Igreja Católica optou por este tempo.
A quaresma é um dos ritos que mais preocupam alguns
chefes de Terreiro, no tocante a como se comportar. Para entender o que seria a
quaresma para nós, devemos entender primeiro a chamada paixão de Cristo.
Enquanto para os católicos este período é de sofrimento para Jesus, culminando
em sua morte dolorosa, para nós, espiritualistas, ele é na verdade o auge do
desenvolvimento espiritual do homem Jesus. Assim, sua morte na cruz, já
planejada para esta sua última vida na carne, longe de ser motivo de tristeza,
é motivo de contentamento. Aquele Espírito atingiu o mais alto nível de
evolução possível para um ser humano. Aquele Espírito ficou face a face com a
inesgotável fonte de energia divina.
Assim, para nós, umbandistas, o significado da
quaresma não pode ser o mesmo, por dois motivos: o primeiro, é o fato de não
ser um ritual nosso; o segundo é pela forma como encaramos a crucificação de
Jesus. Os terreiros não só podem, como
devem abrir suas portas para fazer a caridade. Nada existe, do ponto de vista
espiritual que diferencie esse período do resto do ano.
Mais ainda, se as vibrações de dor, pena e culpa que
tomam conta de uma parcela da população facilitarem a presença de espíritos de
baixa estatura espiritual, que seja, nossas entidades estão ali para trabalhar
e ajudar não só nossos fiéis e filhos umbandistas, como também para aproveitar
a oportunidade para resgatar alguns desses espírito e conduzi-los para a luz.