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quinta-feira, 19 de setembro de 2019

RELIGIÕES DO RIO 1904 Segunda Parte



       
·        Magia Negra

“A magia negra teve, principalmente na Europa, toda uma suntuosidade ritualística e litúrgica. Lá eram os nobres, os burgueses os seus seguidores. No entanto, no Brasil com sua mistura com elementos africanistas e mesmo indígenas perdeu toda essa teatralidade e riqueza, mantendo, porém, seu poder ameaçador. As entidades espirituais que realizavam os seus trabalhos demonstravam uma sinistra sabedoria, recursos formidáveis e energia fluídica aterradora”. (Leal de Souza – adaptação de trechos da obra citada)

A magia negra era aquela que se propunha utilizar forças sobrenaturais com a finalidade de prejudicar ou causar o mal a alguém. Erroneamente muita gente considera que o termo magia negra pode definir também as práticas e rituais cerimoniais e litúrgicos de antigos cultos praticados pelas antigas civilizações, como a persa, egípcia, celta e outras. Isso, no entanto, não é verdade, pois tal como os sacrifícios que eram praticados em Israel para o Senhor, ou para o Altíssimo, tinham um caráter ritualístico e não de magia negra.

Os sacrifícios na maioria das regiões do mundo tinham também a função alimentar por que, depois de oferecido o sangue ao seu Deus, a carne era utilizada em festas onde ela era distribuída ao povo envolvido nessa oferenda. Quando esses povos rogavam a seus Deuses que os ajudassem nas lutas contra seus inimigos não era magia negra. Também não o era quando faziam suas oferendas por uma boa colheita ou em homenagem a um dia especialmente importante para essa cultura. Na verdade, eles estavam se valendo de sua fé para vencerem as agressões de outros povos, para conquistar territórios, para bons resultados nos campos ou simplesmente usando aquele sacrifício como veículo para sua fé. Este instrumento era como o acender uma vela, colocar alimentos, flores ou se ajoelhar ou prostrar-se no Templo.

Claro que naquela época existiam também os feiticeiros ou magos, mas os rituais deles eram praticamente secretos, com a presença, quando havia, dos interessados no assunto para o qual era feito o pedido. As entidades na magia negra eram invocadas porque, supostamente, possuíam sabedoria para o mal e poderes mágicos e energias enormes. Utilizavam pontos cabalísticos para fazer seus trabalhos. Esta magia ocorria cada vez que um mago invocava um espírito demoníaco ou das trevas para se comunicar com ele e fazê-lo produzir um determinado efeito, podendo ser utilizada para todo e qualquer tipo de propósito.

As oferendas, na magia negra, eram presentes ou pagas para as entidades inferiores para que prejudiquem à pessoa a quem era dirigido o trabalho. O material usado definia quão baixo era o nível espiritual dos espíritos invocados. É certo que as entidades invocadas não se alimentavam com os materiais colocados para eles, mas, aqueles que o faziam esperavam que eles fossem utilizados como fornecimento da energia que deles exalavam ou que deles podiam extrair para a execução do trabalho.  Esses despachos podiam ser executados, pelo menos, de três maneiras por aquele que conduz a ação.

A primeira através do contato fluídico entre o feiticeiro e aquele que desejava prejudicar, nesse caso, utilizavam objetos, roupas, partes do corpo da pessoa, como as unhas, os cabelos, barbas, etc.  A partir daí, através do seu magnetismo pessoal concentravam-se no objetivo desejado e na vítima a ser atingida e através dessa força e de eventuais quedas de vibração da vítima conseguiam atingi-la.

A segunda em contato com entidades de desenvolvimento espiritual nulo ou quase nulo e através de oferendas a essas entidades transformavam-nas praticamente em escravas suas ou da casa onde o feiticeiro trabalhava. Muitas vezes pela própria desorientação espiritual em que se encontravam, esses espíritos de desenvolvimento inferior se deixavam manipular por outros espíritos do mal, encarnados ou desencarnados que não possuíam nenhuma formação moral e religiosa.

A terceira forma os magos negros se aproveitavam de problemas gerados em outras encarnações entre a vítima e espíritos que ainda traziam consigo a ira, a raiva, a percepção turvada apesar do passar dos tempos. Estes espíritos se prestavam a trabalhos de vingança, de tornar atribulada a vida da pessoa a quem era dirigido o dito trabalho. Buscavam prejudicar a saúde e, em casos extremos, levar à morte aqueles que eram objeto da ira de quem encomendava o trabalho. Eram produzidos fatos exteriores à pessoa (doença, acidentes, etc.) que levavam à fragilidade física aquelas que eram o alvo, as vítimas.

Pelas formas que foram descritas acima vemos que o trabalho do mago ou feiticeiro não conta necessariamente com uma mediunidade de incorporação, mas usa espíritos inferiores, utilizando sua própria força magnética e concentrando-se para que o mal aconteça a quem é dirigido. Devemos nos lembrar que por sua atuação com essas energias baixas, ruins mesmo, o mago normalmente tem, ao fim e ao cabo, suas próprias energias deterioradas e sua saúde prejudicada.

Após 1908, a Umbanda, então chamada Magia Branca, passou a combater a Magia Negra utilizando-se de entidades de luz que se reuniram com a finalidade de praticar a caridade e livrar aqueles seres humanos de trabalhos que haviam sido feitos contra eles pela Magia Negra.

Devemos relembrar que quando a pessoa a quem foi dirigido o trabalho consegue manter sua vibração acima daquela que foi utilizada pela magia, com o objetivo de atingi-la, com pensamentos positivos, posturas e comportamentos adequados à Lei Maior de Cristo – o Amor – nenhuma magia se sintonizará com ela pois, suas ondas vibratórias se encontrando em nível superior, não haverá o encontro com as vibrações do mal que lhe foram dirigidas.


·        Casa das Almas

Durante toda a história da humanidade, a angústia pela perda dos entes queridos fez com que as pessoas buscassem uma forma de ter notícias desses parentes ou amigos através de médiuns que diziam ter o poder de se comunicar com o mundo espiritual.

Na antiguidade, os magos e os feiticeiros, em algumas culturas, já tinham um espaço destinado à invocação das almas de antepassados. Porém não tinham a finalidade com que foi utilizada no Brasil. Naquelas civilizações, fazia-se o culto aos mortos utilizando métodos divinatórios, envolvendo a força de deuses da escuridão, do mundo inferior enquanto o sol minguava. Por outro lado, era também chamada a festa do deus Cerne, na qual os mortos se faziam visíveis e com quem poderiam interagir. A utilidade dessa comunicação com os mortos tanto poderia ser para o bem quanto para o mal. Em outros lugares essa Casa das Almas servia para recebimento e doação de alimentos a necessitados e
também para acender velas para as Almas das pessoas queridas. No Oriente, a Casa das Almas é um costume que existe a milhares de anos e que consiste em se dar alimentos para os antepassados. Também no Brasil, na cultura indígena, em especial os Nhambiquaras, que viviam perto da Chapada dos Parecis tinham sua Casa das Almas para reverenciar seus mortos.

Com o advento do espiritismo, a partir de 1850, que popularizou a mediunidade, várias pessoas passaram a dizer que tinham essa capacidade, e que podiam trazer notícias dos mortos queridos. Durante muitos anos, tanto aqui quanto no exterior, os verdadeiros espíritas não pararam de desmistificar inúmeras pessoas que se utilizavam de trapaças e truques querendo demonstrar poderes que realmente não tinham.

Essas mistificações se agravaram com a abolição da escravatura. Como a libertação dos negros, no Brasil, se deu sem que a eles fossem propiciados fatores de produção que permitissem o seu sustento, aqueles que estavam no ambiente urbano, principalmente nas grandes cidades passaram a ter necessidade de garantir o seu próprio sustento. Nos primeiros anos de nossa primeira república os negros libertos passaram a utilizar-se do parco conhecimento que tinham, sobre o lado divinatório e de encaminhamento e comunicação com os mortos, que já vinham da cultura de suas tribos na África, para ganhar algum dinheiro que lhes permitisse viver.

Alguns criavam um ambiente para funcionar o que eles chamavam de Casa das Almas com a finalidade de atender aos clientes na comunicação com os seus mortos. Outros se utilizavam de sementes e conchas para sustentar as informações dadas aos seus clientes. Sempre esses atendimentos se faziam mediante um pagamento. Em pequenos cômodos com velas, cruzes e imagens de santos evocavam os mortos ou jogavam suas sementes ou conchas; quando famílias perdiam seus entes queridos e queriam falar com eles ou despachá-los – fazer com que se fossem e não ficassem perturbando os vivos. Se os parentes possuíam ou arranjavam dinheiro, algo em torno de $300,00 contos de réis, para pagar aos feiticeiros mais famosos que conduziam essas Casas conseguiam que o rito necessário fosse feito. Caso não tivessem essa quantia, eram “obrigados” a conviver com o parente morto, que se recusava a partir ou não conseguiam se comunicar com o seu parente falecido.

Todos os trabalhos eram em meio a cerimônias, que davam a eles uma teatralidade voltada para o sentimento que interessava em cada caso e que iam da emoção pelo reencontro até o medo pela presença daquele “espírito” a ser “encaminhado”.

Uma última ressalva que necessitamos fazer é que na maioria dos casos em que interferiam os ditos “médiuns” nem sabiam o que era mediunidade, se conheciam era de ouvir dizer e nem tinham o poder que diziam ter.