O que é Religião
A palavra religião, no conceito
mais comum, teria vindo da latina “religare” que significa religar, voltar a
unir. No caso, ser religioso representaria uma busca de se religar à Energia
Divina, a Deus. Outra versão seria que viria também do latim, da palavra
“religio” que significa cultuar ou louvar a Deus. Finalmente, existe uma
terceira versão que, também vinda do latim, mas da palavra “relegere” que
significa reler e, por isso, foi relacionado à releitura permanente dos textos sagrados,
visando compreender a verdadeira vontade de Deus para poder segui-la da forma
mais perfeita ou exata possível. Embora diferentes, diríamos que essas
definições são complementares, já que em uma religião buscamos nossa evolução
e, consequentemente, ao fim desse processo a nossa ligação com Deus; buscamos
também, através da religião cultuar o Deus que existe em nós, nossa centelha
divina, o Deus dos nossos corações e de nossas consciências; e, finalmente,
para que todo o anterior ocorra, nós, os cristãos, devemos sempre estar relendo
o Evangelho de Cristo, para não agirmos contrariamente a ele.
Ao longo da história do homem as
religiões desempenharam sempre um papel de destaque na evolução da civilização[1]. Desde a aurora do homem
existem manifestações religiosas. As primeiras manifestações ocorreram no
entorno do ano 100.000 a.C. Naquela época, ao providenciarem o sepultamento de
seus mortos, enterravam com eles seus bens, ferramentas e outros objetos,
pensando que esses mortos poderiam precisar deles na vida após a morte. Daquele
período a única informação que nos chegou acerca de suas crenças foram esses
resquícios de seus ritos fúnebres. Entre os anos 5.500 e 4.000 a.C. a
civilização suméria fazia o culto à Deusa Mãe, conformando-se na primeira religião
do homem. Nesse culto uma de uma variedade de
divindades femininas e símbolos maternais de criatividade, nascimento,
fertilidade, união sexual, nutrição e o ciclo de crescimento, que o homem ao
longo de sua história cultuou, não havendo uma civilização, sequer, que se
absteve de ter uma Deusa que simbolizasse tudo aquilo e, em especial a
maternidade. Também no estudo da cultura mesopotâmica foram encontrados
registros de um culto a uma Deusa Mãe O termo, foi aplicado, durante muitos e
muitos séculos, a deusas, semideusas diversas. As evidências arqueológicas mostram isso desde os anos 5.500 a.C. até fins
do século XIX e início do século XX d.C.
No Egito, cerca de 3.000 a.C.
aparece a sua mitologia que, na origem, era uma religião politeísta. A
mitologia grega se desenvolve a partir século 800 a.C.
A mitologia romana aparece, em
meados dos anos 700 a.C, depois da mitologia grega, na qual parece haver se
baseado. Essas, eram todas, religiões politeístas. A primeira tentativa de
fazer uma religião monoteísta foi do Faraó Egípcio Amenofis IV, posteriormente
chamado Akhenaton, que declarou como único Aton, colocando-o acima dos deuses
até então existentes. No entanto, isso não foi aceito pelos sacerdotes e a
elite egípcia que, após a morte de Akhenaton, restauraram a antiga religião.
Somente no século IV d.C. uma religião monoteísta – a Católica – se torna
oficial de um Império, que à época dominava o mundo, o Império Romano.
Apesar de todas as diferenças que existem entre as
diversas religiões, em especial na crença em um ou mais deuses, todas elas têm
muita coisa em comum. Por exemplo, nenhuma religião é feita sobre um vazio de
símbolos. Ou seja, todas elas possuem símbolos próprios que representam aquilo
que aquela religião respeita e cultua. Usados em suas cerimônias e em seus
rituais, eles levam seus seguidores, estejam onde estiverem, a reconhecer a
presença de sua religião e por consequência relembrar que seu Deus, que na
verdade é o Deus único, de todos, está sempre presente em todos os lugares.
Todos os símbolos e objetos de uma religião estão
ligados aos seus ritos ou às suas divindades, sejam como objetos necessários à
sua consecução, sejam como sujeitos desse rito, sejam como identificadores
daqueles ou daquele que ali é venerado ou como pano de fundo da fé inspirada
pela religião. A imagem de um santo pode fazer parte de uma cerimônia católica,
como um elemento presente ao ritual, sem necessariamente participar ativamente
dele; por exemplo, em uma missa ela pode estar no altar, mas não ser o centro
das atenções e da devoção; ou pode também ser objeto de devoção e reverência em
uma solenidade, por exemplo, católica, umbandistas ou candomblecista, quando se
festejar o seu dia e nesse determinado momento se tornará foco central para o
culto dos fiéis.
Em uma Tenda de Umbanda temos, normalmente, no
Congá pelo menos as imagens de Oxalá, do Preto Velho e do Caboclo. Se estamos
em uma gira de atendimento, a imagem de Oxalá é e será sempre o símbolo maior,
mas as de Pretos Velhos e Caboclos, embora sejam símbolos importantes, serão
acessórias para o ritual daquele momento. Se vamos homenagear a entidade, em
uma festa dos Pretos Velhos por exemplo, a imagem vai para um lugar de destaque.
Para a nossa religião, podemos citar como alguns dos seus objetos sagrados as
Guias, a Pemba, a Toalha, a sineta, podendo existir outros de acordo com a
forma e o rito de cada Casa.
No Budismo Tibetano também podemos ver isso em
relação a Buda, quando em determinadas solenidades, apesar de sua importância,
quase divina, nessa religião, ele não é o foco do culto. Quando estão fazendo
uma meditação, estão voltados para o seu eu; ou embora estejam em um Templo
dedicado, por exemplo, a deusa Tara e apesar de que ela seja uma importante
divindade do budismo tibetano, também ela não é o foco desse ritual de
meditação. No entanto, o budista, em um ritual específico, pode cultuar essa
deusa e entoar a ela mantras e orações, e, a ela, direcionar seus pedidos. Esses
objetos de culto, portanto, desempenham papéis diferenciados nos diferentes
momentos de uma religião, mas todos tem uma grande importância nos seus
rituais.
Na medida em que realmente nos
vinculamos a uma religião, sem fanatismo, mas com a certeza de termos
encontrado nosso caminho, melhor nos sentiremos em participar de seus rituais e
mais próximos de Deus nos perceberemos. Assim, estaremos reconectados ao que de
mais misterioso tem a vida, a sua origem. Saberemos assim que não estamos sós e
desligados do mundo, que tem algo
maior do que nós que reina nos universos e que
Ele também se encontra em nós e é Ele quem faz essa ligação entre todas as
coisas e seres do universo. Também perceberemos que não só o que está fora de
nós é maior e nós não O conhecemos, mas, também, que o que está dentro de nós é
maior e nós também não O conhecemos. E é na busca desses conhecimentos que os
rituais nos ajudam, porque nos revelam o externo e nos mergulham no interno.
A religião para o
religioso é a expressão da sua fé. Nos tempos modernos, não podemos dizer que a
religião induz à fé, como sempre foi em tempos passados, não só no passado
recente como na antiguidade. Apesar
disso, para nossos ancestrais, aquilo em que acreditavam, era verdade. Hoje, no
entanto, algumas religiões já levam seus seguidores a pensar, a ter uma fé
raciocinada. Esta fé não aceita mais afirmações que contradizem o racional.
Claro que alguns dogmas têm de ser aceitos, mas a partir daí o pensamento e o
livre arbítrio devem predominar.
Alguns pensadores
religiosos já começam inclusive a criticar a fé, por considerá-la irracional,
querendo que a religião sobreviva apenas daquilo que for comprovado pela
ciência ou pela lógica. Abaixo apresentamos um diálogo entre a fé e a ciência,
mediado pela razão, publicado em 1859. Aqui citaremos apenas algumas passagens,
mas no anexo, ao final deste livro, está todo o texto.
A FÉ - O que é
que chamais de absurdos?[2]
A CIÊNCIA -
Chamo de absurdos as proposições contrárias às minhas demonstrações, como, por
exemplo, que três são um, que um Deus se fez homem, isto é, que o infinito se
fez finito. Que o Eterno morreu, que Deus puniu seu filho inocente pelo pecado
dos homens culpados...
A FÉ - Não digas mais nada. Externadas por ti, essas proposições são, de fato, absurdos. Por acaso sabes o que é o número em Deus, tu que não conheces Deus? És capaz de raciocinar sobre as operações do desconhecido? És capaz de entender os mistérios da caridade? .................................
A FÉ - Não digas mais nada. Externadas por ti, essas proposições são, de fato, absurdos. Por acaso sabes o que é o número em Deus, tu que não conheces Deus? És capaz de raciocinar sobre as operações do desconhecido? És capaz de entender os mistérios da caridade? .................................
A CIÊNCIA - Começo a te compreender, ou melhor, vejo que nunca te compreenderei. Nesse caso, continuemos separadas, nunca precisarei de ti.
A FÉ - Sou menos orgulhosa e reconheço que me podes ser útil. Talvez também sem mim estarias bem triste e bem desesperada, e não quero separar-me de ti, a menos que a razão o consinta.
A RAZÃO - Não façais isso. Sou necessária a ambas. E eu, que faria sem vós? Preciso saber e crer para ser justa. Mas nunca devo confundir o que sei com o que acredito. Saber não é mais acreditar, acreditar não é saber ainda .........................................
A FÉ - Pois
bem! irmã ciência, o que dizeis disso?
A CIÊNCIA -
Digo que estávamos separadas por um deplorável mal-entendido e que, doravante,
podemos andar juntas. Mas a qual de seus símbolos me vais associar? Serei
judia, católica, muçulmana ou protestante?
A FÉ -
Continuarás sendo a ciência e serás universal.
A CIÊNCIA - Ou seja, católica, se bem compreendo. Mas o que devo pensar das diferentes religiões?
A CIÊNCIA - Ou seja, católica, se bem compreendo. Mas o que devo pensar das diferentes religiões?
A FÉ -
Julga-as por suas obras. Procure a caridade verdadeira e, quando a tiver encontrado,
pergunta-lhe a que culto pertence.
.......................................................................................................................
A CIÊNCIA - Ó
fé, perdoa-me então se não posso acreditar, mas sei agora por que és crente. Respeito
tuas esperanças e partilho de teus desejos. Mas é pesquisando que eu encontro e
é preciso que eu duvide para pesquisar.
A RAZÃO - Trabalha e procura, então, ó ciência, mas respeita os oráculos da fé. Quando tua dúvida deixar uma lacuna no ensinamento universal, permite à fé preenchê-la. Andai distintas uma da outra, mas apoiadas uma na outra, e nunca vos separeis.
Nesse diálogo, podemos ver a grande
influência sobre Eliphas Levi da Igreja Católica, mas isso é natural já que
estudou toda sua vida em colégios católicos, tendo sido ordenado diácono, em
1835, e somente não chegando a sacerdote por que se apaixonou e abandonou a
carreira religiosa seis meses antes da ordenação sacerdotal.
No Evangelho segundo o Espiritismo,
ao final da Obra, em uma nota explicativa colocou-se um texto atribuído a
Kardec que está transcrito abaixo. Este texto é contemporâneo do de Eliphas
Levi, meados do século XIX, e sua essência é idêntica ao que este escrito
expõe. Em lugar da fé cega que
anula a liberdade de pensar, ele diz:
“Não há
fé inquebrantável senão aquela que pode olhar a razão face a face em todas as
épocas da Humanidade. À fé é necessária uma base, e essa base é a inteligência
perfeita daquilo que se deve crer; para crer não basta ver, é necessário,
sobretudo, compreender. A fé cega não é mais deste século; ora, é precisamente
o dogma da fé cega que faz hoje o maior número de incrédulos, porque ela quer
se impor e exige a adição[3]
de uma das mais preciosas faculdades do homem: o raciocínio e o livre
arbítrio."[4]
Podemos
ver que a fé cega que alguns intelectuais hoje criticam, já não era aceita a
cerca de 150 anos atrás e nem por isso a fé deixou de existir e de ser o
sustentáculo de toda e qualquer religião. Nós, os Umbandistas, não devemos
engrossar o caudal de pessoas que ainda seguem, cegamente, seus líderes
religiosos que, na maioria das vezes, somente querem se aproveitar dos seus
seguidores, dando as interpretações que lhes interessa ao texto bíblico. Um
exemplo de interpretação distorcida é a utilização do dízimo por determinadas
Igrejas, com o objetivo de enriquecer seus pastores. Outro exemplo, são os
pretensos pais de santo ou pais de terreiro que enxovalham nossas religiões
prometendo resolver todos os problemas, através de trabalhos que os incautos
têm de pagar.
Apesar
das críticas de intelectuais, que muitas vezes se declaram ateus, muito mais
por terem medo de parecerem ridículos, frente aos seus pares, do que por convicção,
devemos reconhecer que a fé finda com qualquer discussão quando atingimos um
determinado nível de argumentação; ou seja, o debate se esgota pois se choca
com aquilo que chamamos de matéria de fé, ou dogma, algo que por sua religião
um dos contendores não abre mão e o outro, por seu ateísmo, ou por ter outra
religião, não aceita, mas não consegue desmentir. Por exemplo, imaginem um
umbandista e um crente discutindo a reencarnação. Seria impossível para ambos
desfazer a matéria de fé do outro, pois qualquer um dos dois se quiser
permanecer em sua religião teria que ter a posição que têm, o umbandista crendo
na reencarnação e o crente não a aceitando de forma alguma. Se um deles mudar
de opinião, pode até continuar frequentando sua Igreja, mas no tocante à
filosofia, aos dogmas, estará deixando sua religião. Em nossa religião vemos
muito isso. Pessoas chegam ao Terreiro, dizem que gostam, que se sentem bem na
Umbanda, acreditam na reencarnação, têm fé nas entidades, mas se dizem
católicas porque todo domingo vão à missa.
[1] Servirá
de um bom embasamento para quem quiser se aprofundar a obra em quatro volumes,
História das Religiões, da Editora Hedra, coordenada e escrita por vários
pesquisadores e historiadores.
[2]A Chave dos Grandes Mistérios
– Eliphas Levi - resumo da primeira parte em forma de diálogo - A FÉ, A
CIÊNCIA, A RAZÃO
[3] Adição
no texto tem o sentido de o raciocínio e o livre arbítrio se unam à fé sem
questioná-la.